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Aposta mundial para uma economia de baixo carbono, o hidrogênio verde é apontado pela Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) como uma das fontes de energia com maior potencial de inovação. O uso do combustível do futuro é parte da estratégia energética de ao menos 33 países, de acordo com o Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês). Com o objetivo de tornar esse mercado viável, empresas estrangeiras têm intensificado parcerias no Brasil, de olho no alto potencial nacional dos setores eólico e solar.
O hidrogênio é um combustível obtido por meio da eletrólise, processo químico em que uma corrente elétrica separa o hidrogênio do oxigênio que existe na água. O gás é chamado hidrogênio verde quando a eletricidade vem de fontes renováveis. Um dos pontos fortes do Brasil é justamente a matriz renovável, de modo que o país pode se tornar exportador do combustível em alguns anos. Para isso, é preciso superar desafios tecnológicos e regulatórios.
A classificação por cores é para indicar como o hidrogênio foi produzido. Além do verde, existe o azul, obtido a partir de gás natural, com tecnologias de captura, utilização e armazenamento de carbono. O hidrogênio cinza, por sua vez, vem do gás natural, mas sem redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE). Já o marrom é produzido com carvão mineral e o hidrogênio musgo é obtido por meio de biomassa ou biocombustíveis, por processos como gaseificação ou biodigestão anaeróbica. Depois de separado do oxigênio nesse processo de eletrólise, o hidrogênio tem diversos usos. Um muito comum é para produção da gordura hidrogenada, usada para fazer margarina. O gás também é usado na siderurgia e como combustível para transportes.
Uma das grandes vantagens do hidrogênio é ser considerado um vetor de energia, ou seja, ele permite o armazenamento de energia para ser usada em outros setores, o que favorece a integração. “Existem experimentos em que em vez de produzir eletricidade para mandar para rede, na torre [da usina eólica] offshore produz diretamente hidrogênio verde. Tem um eletrolisador na base. Em vez de transportar eletricidade, transporta o hidrogênio”, explica Jurandir Picanço, do núcleo de energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).
Nos transportes leves, o hidrogênio é uma opção sustentável para o processo de eletrificação de veículos. Ao ser queimado, ele não produz dióxido de carbono, um dos gases responsáveis por intensificar o aquecimento global. O hidrogênio também é uma alternativa para setores de difícil abatimento de emissões de carbono. Estudo do Hydrogen Council publicado em fevereiro mostra que até 2050, 18% da demanda de energia global será de hidrogênio. Já de acordo com relatório do Energy Transitions Commission (ETC), think tank especializado em crescimento econômico e mitigação das mudanças climáticas, em um cenário em que o hidrogênio represente de 15% a 20% de toda demanda energética global — o equivalente a um crescimento de cinco a sete vezes da demanda atual — os investimentos necessários até 2030 seriam da ordem de US$ 800 bilhões por ano, considerando desde as fontes de energia até os eletrolisadores. Até 2050, o montante sobe para US$ 15 trilhões.
Puxados pelo interesse de instituições estrangeiras, projetos para viabilizar a produção comercial do hidrogênio verde no Brasil já superam US$ 20 bilhões, com foco majoritário na exportação. Hoje as principais iniciativas se concentram no Porto do Pecém, no Ceará; no Porto do Açu, no Rio de Janeiro; e no Porto de Suape, em Pernambuco.
No Ceará, ao menos nove empresas, incluindo as australianas Energix Energy e Fortscue, a francesa Qair, a White Martins e a Neoenergia, assinaram entre fevereiro e setembro memorandos de entendimento para produção do combustível sustentável. Em setembro, a multinacional portuguesa EDP anunciou a primeira usina de H2V do estado, que deve iniciar operação em 2022. O investimento é de R$ 42 milhões.
Se metade do potencial das energias solar e eólica — as duas fontes renováveis que mais crescem no Brasil — forem destinadas ao H2V, o Ceará poderá produzir cerca de 20 milhões de toneladas do combustível verde, o que representa 13% do mercado global estimado para 2050, de acordo com dados da Fiec. “O mercado de hidrogênio verde vai surgir e há uma expectativa de que condições no Brasil sejam excelentes para esse propósito. Vai ser uma disputa mundial porque inúmeros países estão desenvolvendo seus projetos. O Brasil já é visto como sendo um importante player desse mercado”, afirma o especialista.
A Fiec faz parte de um grupo de trabalho criado para desenvolver políticas públicas de energias renováveis para a configuração do HUB de Hidrogênio Verde no Ceará. Um dos pontos fortes do estado é a estrutura do Porto de Pecém, empresa de economia mista controlada pelo governo do Ceará e pelo Porto de Rotterdam, que quer se transformar em importador de hidrogênio na Europa. O empreendimento brasileiro é composto por uma área industrial, o porto e uma Zona de Processamento de Exportação (ZPE). A intenção é que todas as etapas do processo de produção do hidrogênio verde — incluindo geração da eletricidade, eletrólise da água, armazenamento e transporte — sejam concentradas no local para exportação do combustível.
Por ser um vetor de energia e uma alternativa de combustível sustentável, o hidrogênio verde tem ganhado destaque na estratégia energética e climática de diversos países, desde 2018. Essa tendência ganhou força com as mudanças causadas pela pandemia de Covid-19 e também com os esforços para acelerar a transição energética nos países com alta emissão de gases de efeito estufa, em acordo com as metas do Acordo de Paris.
A atualização do plano dos Estados Unidos lançada em 2020 definiu objetivos para que o hidrogênio e suas tecnologias relacionadas se tornem competitivas até 2050. A Coreia do Sul quer alcançar a capacidade de produção de 6,3 milhões de veículos elétricos a células a combustível e 1.200 estações de reabastecimento em 2040. Japão e Austrália também têm estruturado suas políticas energéticas em torno do combustível do futuro.
Na Europa, o Plano de Desenvolvimento do Hidrogênio para a Transição Energética anunciado pela França em junho de 2018 inclui metas de 20% a 40% de uso de hidrogênio de baixo carbono em aplicações industriais do hidrogênio. Já a Alemanha, ao consolidar sua Estratégia Nacional do Hidrogênio em junho de 2020, reforçou o financiamento de mais de 1 bilhão de euros a ser aplicado em hidrogênio no âmbito do Programa de Descarbonização da Alemanha, entre 2020 e 2023, com adicionais 7 bilhões de euros para acelerar o desenvolvimento do mercado alemão e 2 bilhões de euros para parcerias internacionais.
A necessidade desses países de alcançar metas sustentáveis somada à limitação de disponibilidade de fontes renováveis de energia em seus territórios, tem levado à busca por colaborações que impulsionem a cadeia global e que atendam à demanda existente e futura. As parcerias visam acelerar as reduções de custos dessa rota tecnológica. Nesse cenário, o Brasil, por sua vez, pode se tornar exportador do combustível, devido à alta participação de renováveis em sua matriz energética. De acordo com o Plano Decenal Energético, elaborado pela EPE, a maior oferta de energia elétrica até 2030 será de empreendimentos eólicos, representando uma expansão de 16,4 GW.
O hidrogênio também está presente no Plano Nacional de Energia 2050, aprovado em dezembro de 2020 pelo Ministério de Minas e Energia. A perspectiva é de mistura de hidrogênio nas redes de dutos de gás natural em porcentagens e com pressões limitadas para fins de transporte e armazenamento, a fim de melhorar o uso desses dutos e usar o combustível para fins energéticos.
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