Zonas de processamento de exportação: promoção do investimento com responsabilidade fiscal

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ZONAS DE PROCESSAMENTO DE EXPORTAÇÃO: PROMOÇÃO DO INVESTIMENTO COM RESPONSABILIDADE FISCAL

Helson Braga, Ph.D.
Presidente da ABRAZPE
20/08/2018

As Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) foram criadas pelo Presidente Sarney, no final dos anos 80, como um ambicioso programa destinado a alcançar, simultaneamente, vários dos principais objetivos de uma política econômica, tais como estimular o investimento (nacional e estrangeiro), criar empregos, aumentar as exportações, difundir novas tecnologias e promover o desenvolvimento regional.

Ele se inspirou em uma das mais bem-sucedidas experiências no mundo para a promoção do desenvolvimento econômico. Estima-se que hoje existam mais de 4 mil ZPEs (ou zonas francas, como são, genericamente, conhecidas), espalhadas por cerca de 140 países, entre os quais os Estados Unidos e a China, que utilizam esse instrumento como parte essencial de suas estratégias de desenvolvimento.

Ao longo desses anos, foram criadas 26 ZPEs no Brasil, em 23 Estados da Federação, sendo que somente uma delas, a de Pecém, no Ceará (onde está instalada uma siderúrgica de US$ 5,4 bilhões, que gera 4.000 empregos diretos e já responde por mais de 10% do PIB do Estado), chegou a entrar em funcionamento.

O fato de as ZPEs não terem reproduzido aqui o mesmo sucesso observado no resto do mundo se deve ao caráter restritivo e anacrônico de nossa legislação, quando comparada às utilizadas por outros países. Assim, com o objetivo de atualizar e modernizar a legislação sobre a matéria, o Congresso Nacional tomou a iniciativa de elaborar um projeto de lei, que já foi aprovado por duas comissões e pelo plenário do Senado e por quatro comissões da Câmara dos Deputados.

Atualmente, esse projeto se encontra pautado no plenário da Câmara, aguardando ser colocado em votação. Isso só não ocorreu ainda por ter surgido, no apagar das luzes, um texto apresentado como “projeto do governo”, o qual, na nossa visão, “desidrata” o projeto do Congresso Nacional, inutilizando o seu esforço legislativo de vários anos.

Com o intuito de construir uma solução de consenso, o relator do projeto, o deputado Júlio César (PSD/PI), elaborou uma consolidação das duas propostas, que foi discutida com as equipes do Ministério da Fazenda, do MDIC e da Casa Civil. O novo texto incorpora a maioria dos pontos constantes do “projeto do governo” e ajusta a sua própria redação para acomodar os dispositivos sugeridos por esse projeto. No entanto, apesar dos significativos avanços alcançados, persistem divergências que vão além das considerações estritamente técnicas e dependem da uma decisão sobre a qualidade e a competitividade do nosso sistema produtivo.

Pode-se demonstrar que as ZPEs:

  • Não dependem de recursos do Governo Federal, uma vez que são financiadas predominantemente pelo setor privado, com algum envolvimento dos governos estaduais;
  • Não acarretam perda nem renúncia fiscal, uma vez que as exportações já são constitucionalmente isentas de tributos indiretos (estando a empresa em ZPE ou fora dela), e as vendas internas são normalmente tributadas;
  • Não introduzem competição desleal com o restante da indústria, na medida em que as parcelas vendidas no mercado interno pagarão todos os tributos incidentes sobre as importações normais, com a vantagem de criar empregos aqui e não lá fora; e
  • São inteiramente compatíveis com o restante da política industrial e de comércio exterior e com as normas da Organização Mundial de Comércio.

Convém ter presente também que as ZPEs constituem projetos estratégicos da maioria dos Estados em que foram criadas e dispõem de um amplo e consciente apoio no Congresso Nacional, que se conta por algumas dezenas de deputados e senadores. São também validadas pela experiência internacional relevante e por instituições multilaterais como o Banco Mundial, a UNCTAD e a OCDE, que apoiaram a implantação desse mecanismo em várias partes do mundo.

É paradoxal que, com todas essas vantagens, o programa das ZPEs continue emperrado, quase três décadas desde a sua criação. Há duas razões principais para isso: a má qualidade da legislação de ZPEs (que tornou o mecanismo pouco atrativo, mas  que estará sendo corrigida pelo projeto de lei mencionado acima) e o arraigado protecionismo da nossa indústria, que vê nas ZPEs somente uma possível concorrência no mercado interno, quando, mais apropriadamente, deveria vê-las como um instrumento para permitir nossa indústria ser mais competitiva no mercado externo.

Por último, deve-se acrescentar que as ZPEs serão compatíveis com qualquer política de abertura comercial que venha a ser implementada pelo próximo governo, a qual, na visão dos analistas mais lúcidos, é absolutamente indispensável para tornar nossa indústria mais competitiva. As ZPEs garantem, de imediato, as condições requeridas por empresas exportadoras, enquanto não se chegar a uma conclusão quando ao ritmo e à amplitude da abertura que alcance a totalidade da economia – que é, sabidamente, um processo complexo e que precisa ser implementado de forma responsável e negociada.

 

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